5 minutos
- Flavio Nascimento
- 10 de abr.
- 2 min de leitura

Andava pelas ruas de uma cidade, meio sem rumo, devagar, quase parando, quando avistei, numa pracinha, um tipo que parecia interessante. Cheguei próximo e pedi, respeitosamente, para sentar-me ao seu lado, numa atitude cristã, que ele estranha, a princípio, mas que deixou-o aliviado depois.
Depois de cumprimentá-lo e desejar-lhe feliz natal, disse-lhe que gostei de vê-lo assim, sentado, em meio a vários pacotes de presentes simples e de vários tamanhos. Perguntei-lhe então o que era mesmo o alvo da minha curiosidade: se ele se sentia melhor com tantos brindes. Respondeu-me que os presentes eram bons, mas não valiosos, e que em todos os anos eram basicamente os mesmos: jardins, bonecas, casinhas de pedreiro, caminhões de entrega e coisas assim. Somente algumas vezes ele ganharia de uma senhora da Assistência Social uma pequena caixa de Lego, mas era tão pequena que, com aquelas peças, não dava para montar quase nada. Quis então mudar de assunto, perguntando sobre as oportunidades de trabalho que surgem no final de ano. Aí também as coisas não estavam muito boas, mas não podia reclamar, pois já arranjara um trabalho neste final de ano. Em dois deles alcançara um salário e meio por mês; estava bom.
Resolvi então mudar de assunto mesmo e observei que o rapaz mendigo era negro, não cheirava muito bem, mas tinha boa aparência e era até um pouco asseado. Enfiei a mão no bolso de trás, ao que ele se afastou do banco. Daria a ele alguns trocados que apaziguariam a sua situação. Então ocorreu uma coisa surpreendente, pois não conseguia subtrair a carteira. Ela saía e voltava para o meu bolso; enquanto isso, eu quase caía sobre o rapaz, que também parecia diluir-se ou evaporar-se, fugindo de mim mais ainda. Minhas mãos foram ficando mais distantes, e eu não conseguia segurar se corpo que se esvaía em fumaça.
Tombei a cabeça para a ponta do banco, do lado direito, chegando a sentir a batida que se dava, quando eu despertei, no banco da igreja. Acordei completamente ofegante e assustado, enquanto alguns fiéis olhavam para mim, um tanto assustados. Acabara a missa.
Morto de sede, olhei ao redor e acabei tomando um gole de água da pia batismal.
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